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POLÍTICA NACIONAL

Vulnerabilidade aumenta risco de violência contra mulher negra, aponta DataSenado

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A vulnerabilidade econômica perpetua e é fator de risco para o problema social da violência doméstica contra as mulheres negras no Brasil. Essa é uma das constatações de pesquisa do Instituto DataSenado que apontou que dois terços das vítimas, ou seja, 66%, têm baixa ou nenhuma renda e que a esmagadora maioria delas, 85%, convivem com seus agressores.

Os números são da Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher Negra, que ouviu quase 14 mil mulheres que se declararam pretas ou pardas, acima de 16 anos de idade, no período de 21 de agosto a 25 de setembro de 2023. O trabalho é uma estratificação da 10ª edição da Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher, desenvolvida em parceria com o Observatório da Mulher contra a Violência do Senado.

A proposta do trabalho é compreender “as desigualdades estruturais, vulnerabilidades diferenciadas e contextos culturais que afetam as experiências das mulheres e diferentes grupos raciais”.

Pesquisadora do Observatório da Mulher contra a Violência, a psicóloga Milene Tomoike diz que o fato de a maioria das mulheres negras vítimas de violência ainda conviverem com seus agressores aponta para “uma realidade de extrema vulnerabilidade, onde a dependência econômica e a presença das crianças tornam a cultura desse ciclo de violência ainda mais desafiadora”.

grafico1.png— De certa forma, os resultados reforçam uma tendência. A pesquisa confirma que 66% das mulheres negras que sofreram violência doméstica não possuem renda suficiente para se manter e apenas delas 27% solicitaram medidas protetivas. Esses dados, embora esperados, dentro de um contexto histórico de desigualdade racial e de gênero fornecem um parâmetro mais detalhado, evidenciando, por exemplo, como o nível de escolaridade não garante maior acesso às medidas de proteção — expôs Milene.

Para a pesquisadora, a política traz à luz dados alarmantes que precisam ser levados em consideração para que políticas públicas efetivas e equitativas sejam geradas.

— O que a pesquisa traz é um cenário atual de como a mulher negra observa a violência, entende a violência e vivencia a violência doméstica e de gênero hoje. E, por isso, a pesquisa é tão importante para subsidiar políticas públicas, para que a gente possa ver a efetividade e a adesão dessas políticas públicas pelas mulheres que de fato necessitam delas. Esses números representam vozes de mulheres — afirma a pesquisadora.

Perfil

Dos 45 milhões de mulheres negras brasileiras, 38% vivem no Sudeste e 36% no Nordeste. São Paulo tem a maior população feminina negra (18%), seguido do estado da Bahia (10%) e de Minas Gerais (10%). Mas quando se analisa a proporção de negras/mulheres por estado, a Bahia tem a maior concentração: 80%.

A maior parte é formada por jovens e adultas entre 16 a 24 anos (18%), enquanto 12% já passaram dos 65 anos.

Na escolaridade, 34% possuem o ensino médio completo e 25%, o ensino fundamental incompleto. Apenas 14% conquistaram o ensino superior completo. O percentual de não alfabetizadas é relevante: 6%, o que representa cerca de 2,8 milhões de mulheres negras que não sabem ler ou escrever.

Essa realidade não tem como estar dissociada da renda. Com o baixo nível de ensino formal, a maioria (66%) tem renda familiar de até dois salários mínimos, sendo que 50% se declararam ocupadas, 21%, desocupadas e 28%, fora da força de trabalho. Das que manifestaram ter seu próprio negócio, 66% são trabalhadoras informais.

Pelo menos 45% das mulheres negras dividem seus domicílios com quatro ou mais pessoas; 78% são mães, sendo que 58% têm filhos menores de 18 anos. Dois terços afirmaram não ter renda individual suficiente para se manterem, assim como aos seus dependentes.

Na religião, 45% se declaram católicas e 26% evangélicas. Elas residem majoritariamente em áreas urbanas (87%).

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Violência

Dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), base alimentada por registros de doenças de notificação compulsória ao Sistema Único de Saúde (SUS), apontam que em 2022 mais da metade (55%) das brasileiras vítimas de violência eram negras. Já entre as vítimas de violência sexual, as pretas e pardas foram 62% e as assassinadas, 67%.

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A vulnerabilidade econômica não resume ou não é fator absoluto para delimitar a violência doméstica de gênero, mas é um fator de risco, segundo a pesquisadora do observatório.

— Hoje, no Brasil, nós temos 45 milhões de mulheres negras, de 16 anos ou mais; dessas 30 milhões recebem até dois salários mínimos. Esse dado coloca a mulher negra em uma situação de vulnerabilidade econômica e de dependência de seus agressores e também os seus dependentes. A dependência financeira dificulta a ruptura desse ciclo de abuso e limita as possibilidades de busca por proteção, de acesso ao serviço de apoio e até mesmo de deixar esse ambiente violento — explica Milene.

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Nesse grupo de vítimas, 39% não possuem renda suficiente para se manter e 27%, ou seja, mais de um quarto, não tem qualquer fonte de renda. Já entre as que dizem ter renda suficiente, o percentual das que se sofreram violência é de 33%.

— Vemos dentro dos dados da pesquisa mulheres negras que enfrentam taxas altíssimas de violência doméstica e uma menor taxa de acesso ao serviço de proteção. Por exemplo, 32% das mulheres negras sem renda declaram já ter sofrido violência doméstica em algum momento da sua vida, e 31% relataram que essas experiências aconteceram nos últimos 12 meses quando nós citamos e apontamos experiências vividas. Ou seja, ela pode não identificar a violência, mas ela de alguma forma vivenciou e não soube identificar que aquilo foi uma violência. Esses dados expõem a interseção de raça, gênero e classe e trazem a perpetuação de um ciclo de exclusão e vulnerabilidade — expõe a pesquisadora.

O mais alarmante é que, entre as vítimas de violência doméstica sem renda suficiente, 85% estão cara a cara com seus agressores no convívio doméstico. Pelo menos 80% têm filhos menores de 18 anos.

Assistência

A busca por ajuda não é algo fácil para as vítimas, tanto que apenas 30% das mulheres negras vítimas de violência buscam alguma assistência de saúde após sofrerem algum abuso grave. Entre as não alfabetizadas, o percentual é um pouco maior: 37%. Os números caem com a melhor escolarização, sendo o pior índice (27%) entre quem possui ensino fundamental completo.

Na mesma linha parte a denúncia. Só 34% das mulheres negras com ensino superior, completo ou não, denunciaram em delegacias os atos de violência sofridos. Já entre as analfabetas o índice chega a 49%.

Quando o assunto é medida protetiva — como a obrigação do agressor de se afastar do lar — entre as mulheres que não possuem renda individual suficiente, somente 27% buscam esse recurso. Também aqui se repete a menor procura por quem tem maior escolaridade.

— Além da vulnerabilidade econômica, outros fatores como medo de represálias, desconfiança nas instituições e até mesmo desconhecimento sobre os direitos podem limitar o acesso a esse tipo de apoio — afirma a pesquisadora Milene.

Respeito

A convivência diária com atos de racismo, com as consideráveis diferenças salariais, com atos de violência doméstica, entre outros desrespeitos, deixam marcas. Não por acaso, 94% afirmam que as mulheres negras não são ou somente às vezes são tratadas com respeito no Brasil. Para 76% delas, a violência doméstica e familiar contra as mulheres aumentou.

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Medo do agressor (71%), falta de punição (61%), dependência financeira do agressor (60%), preocupação com a criação dos filhos (60%), acreditar que o ato violento seria “a última vez” (60%), ter vergonha das agressões (56%) e não conhecer seus direitos (50%) são, na maioria das vezes, explicações para as que temem denunciar a agressão, segundo as entrevistadas.

Apesar de bastante noticiada, a Lei Maria da Penha (Lei 11.340, de 2006), que estabeleceu mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, ainda é pouco conhecida para 70% das mulheres negras. E somente 30% consideram que ela protege, sim, as brasileiras, enquanto 49% disseram que a norma protege apenas “em parte”.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

Fonte: Agência Senado

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POLÍTICA NACIONAL

Ambientalistas e setor elétrico tentam superar divergências em torno da proposta de proteção dos rios

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Reunidos em seminário promovido pela comissões de Meio Ambiente, e de Minas e Energia da Câmara dos Deputados na terça-feira (10), ambientalistas e representantes do setor elétrico debateram divergências em relação ao projeto que cria a Política Nacional de Proteção dos Rios (PL 2842/24).

Entre os itens mais controversos está a previsão de um regime especial de gestão, batizado de Rio de Proteção Permanente, para trechos de curso hídrico, nascentes e várzeas de inundação, podendo incluir afluentes e lagos.

O relator da proposta na Comissão de Minas e Energia, deputado Joaquim Passarinho (PL-PA), recomendou a rejeição do projeto porque a proteção dos rios já está assegurada em outras legislações. Além disso, ele argumentou de que a proposta estabelece metas que impactam diversos setores públicos e da economia, sem prever instrumentos para implementação.

Na audiência, o assessor técnico da Associação Brasileira das Empresas Geradoras de Energia Elétrica (Abrage) Paulo Magalhães Domingues fez outras críticas ao projeto de lei.

“[O texto] Dificulta e até mesmo inviabiliza a implantação de novos empreendimentos hidrelétricos no país e altera as regras de operação das usinas hidrelétricas e reservatórios existentes, colocando em risco o suprimento de energia elétrica no país”, alertou.

“Outra questão é a insegurança jurídica e o aumento dos custos socioambientais. Isso vai passar para a tarifa de energia elétrica”, afirmou.

Metas de transição
O Fórum de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Setor Elétrico (FMase) e a Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa (Abragel) também participaram do seminário.

O setor avalia que o projeto desconsidera do Plano Nacional de Energia e afeta as metas brasileiras de transição energética e de redução das emissões de gases de efeito estufa.

“Se não forem as hidrelétricas na base do nosso sistema, serão as termoelétricas altamente caras, fósseis e poluentes. O Brasil não seria o protagonista que é se não fossem as suas hidrelétricas”, como destacou a presidente da Associação Brasileira de Pequenas Centrais Hidrelétricas (Abrapch), Alessandra Torres.

Proteção dos Rios
A Coalizão pelos Rios, a Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente (Anamma) e o Movimento Tapajós foram alguns dos ambientalistas presentes no debate. Eles ressaltaram o foco da proposta de Política Nacional de Proteção dos Rios em cobrir lacunas da Lei das Águas, da Política Nacional de Meio Ambiente e do Código Florestal.

O diretor internacional da ONG International Rivers Brasil, Flávio Montiel, deu o tom de urgência para a efetiva conservação e manejo dos rios, sobretudo em tempos de mudanças climáticas.

“Os rios estão chegando a um ponto de não retorno, porque cada vez mais o fluxo hidrológico dos rios vem diminuindo. E isso pode comprometer a própria demanda econômica do país.”

Especializada em gestão de recursos hídricos, a diretora de políticas públicas da SOS Mata Atlântica, Malu Ribeiro, reforçou a relevância do projeto de lei, inclusive com a criação do Sistema Nacional de Rios de Proteção Permanente. Para ela, é preciso encontrar pontos de convergência para avançar.

“Diante da crise climática que nós estamos vivendo, não vai ter água nem para o setor elétrico nem para o abastecimento humano”, alerta. “A gente vem aqui defender um zoneamento estratégico. Há regiões em que é importante sim ter reservatórios. Há regiões em que é muito importante não tê-los e em que a função ecossistêmica de rios livres é extremamente necessária. E a gente não consegue fazer isso em Comitê de Bacia”, ponderou.

Construção coletiva
A proposta de proteção dos rios surgiu de construção coletiva encampada pelo coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, deputado Nilto Tatto (PT-SP), que ainda espera reverter a tendência de rejeição ao projeto na Comissão de Minas e Energia.

Tatto espera que a audiência pública contribua para a revisão do relatório que o deputado Joaquim Passarinho. “O projeto é um modelo inspirador de protagonismo ambiental, porque baseia-se em legislação internacional de proteção de rios, adaptados evidentemente ao contexto brasileiro, integrando desenvolvimento sustentável, justiça social e preservação ambiental”, avaliou.

A proposta também será analisada nas comissões de Meio Ambiente, de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça antes de chegar ao Plenário da Câmara.

Reportagem – José Carlos Oliveira
Edição – Rachel Librelon

Fonte: Câmara dos Deputados

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